1 - Obá
luta com Ogum
Obá
era uma mulher cheia de vigor e coragem, não temia ninguém no mundo. Seu maior
prazer era lutar; e Obá venceu Oxalá, Oxóssi, Orumilá e Oxumarê e ainda
desafiou Obaluayê e Exu.
Chegou
a vez de Ogum! Mas Ogum teve o cuidado
de consultar Ifá, antes da luta. Então, preparou a oferenda que lhe fora
indicada: muitas espigas de milho e muitos quiabos, tudo pisado num pilão até
virar uma massa viscosa e escorregadia.
Na
hora marcada, Obá e Ogum se enfrentaram. No inicio, Obá parecia dominar a
situação. Mas Ogum recuou em direção ao lugar da oferenda. E Obá pisou na pasta
viscosa e escorregou.
Ogum
aproveitou para derrubá-la. Tomou-a ali mesmo e se tornou o primeiro marido de
Obá.
Essa
lenda destaca a qualidade guerreira de Obá e a sua determinação e coragem.
Obá
venceu Oxalá, Oxóssi, Orumilá e Oxumarê, também desafiando Obaluayê e Exu,
porque nenhum deles é Orixá guerreiro. Isso destaca que Obá é a guerreira.
Mas
no final da lenda fica bem claro que o grande guerreiro é Ogum, cujo nome quer
dizer justamente “Senhor da guerra”. Porque Ogum foi o único a vencer Obá e o
primeiro a tomá-la como esposa. Isso significa também que Ogum está unido a
Obá, ou seja, que a atuação de Obá é conjugada (“casada”) com a atuação da Lei
Divina e tem o amparo da Lei Divina. Este aspecto sinaliza para um ponto
importante: as nossas “lutas” precisam estar sob o amparo da Lei Divina.
Por
outro lado, embora sendo um grande guerreiro, Ogum cuidou de fazer uma oferenda
antes de ir para a luta com Obá e por isso obteve a vitória. Ou seja, Ogum
reverenciou o Sagrado antes de ir para a luta. Mesmo sendo o Senhor da guerra,
Ogum teve esse cuidado e respeito. E isto reforça o sentido das oferendas no
campo religioso: o de um pedido de licença e de amparo do Sagrado, antes de se
fazer qualquer coisa.
2 - Obá
luta com Oxum
Mais
tarde, Obá tornou-se a terceira mulher de Xangô, por ser forte e corajosa.
A
primeira mulher de Xangô foi Iansã, que era bela e fascinante. A segunda foi
Oxum, coquete e vaidosa.
Uma
rivalidade logo se estabeleceu entre Obá e Oxum. Ambas disputavam a preferência
do amor de Xangô. E Obá tentava descobrir o segredo das comidas que Oxum
preparava para Xangô, e que tanto o agradavam.
Oxum
decidiu montar uma armadilha para Obá: convidou-a para acompanhar a preparação
de um prato que, segundo ela, era o preferido de Xangô.
Obá
chegou na hora combinada.
Oxum
usava um lenço amarrado à cabeça, que escondia suas orelhas. Preparava uma sopa
para Xangô, na qual se viam dois cogumelos flutuando na superfície do caldo.
Oxum convenceu Obá de que os cogumelos eram as suas orelhas, ingrediente
essencial da receita. Xangô veio em seguida e se deliciou com a sopa.
Na
semana seguinte, foi a vez de Obá cuidar de Xangô. Ela decidiu seguir a
“receita” de Oxum. E colocou sua orelha esquerda no preparo.
Xangô
ficou horrorizado ao ver que Obá cortara uma das orelhas e achou repugnante
a comida.
Neste
momento, Oxum chegou e retirou o lenço, revelando que suas orelhas estavam
intactas. Furiosa, Obá precipitou-se sobre Oxum. Uma verdadeira luta se seguiu.
Enraivecido,
Xangô trovejou sua fúria contra as duas.
Apavoradas,
Oxum e Obá fugiram e se transformaram em rios. E até hoje as águas destes rios
são tumultuadas, no lugar de sua confluência, como lembrança daquela disputa.
Essa
lenda destaca vários aspectos:
Primeiro,
que no campo do amor ninguém vence Oxum. Porque Oxum representa o Amor Divino.
Depois,
mostra a determinação de Obá: para alcançar seu objetivo, Ela “cortou uma
orelha”, isto é, não mediu esforços. Claro que não se pode levar isso ao pé da
letra e querer aplicar em nossa vida, pois seria chegar ao extremo do
extremo... As lendas procuram exaltar as Qualidades dos Orixás, isso é o que
precisamos observar e compreender.
Finalmente,
vem o destaque para Xangô como representante do equilíbrio da Justiça e da
razão, que se “enfurece” com as duas por agirem de forma irracional e usarem de
artimanhas para envolvê-lo. Xangô põe um ponto final na situação, aparando as
arestas da irracionalidade no campo do amor e dos relacionamentos: os excessos
emocionais de Obá e de Oxum transbordam ou são “descarregados”, formando dois
rios de águas turbulentas... Vale dizer, Xangô é o grande equilibrador.
Essa
lenda faz pensar ainda sobre outra questão: No Candomblé, quando incorpora em
suas filhas, geralmente Obá leva uma das mãos na direção da orelha esquerda.
Gesto que seria para cobrir o defeito, a falta da orelha cortada, segundo
respeitável tradição.
Agora,
se lembrarmos, de acordo com a tradição africana, que Obá “guarda o lado
esquerdo” (Osì), que é o lado do coração, podemos talvez entender que Ela está
atuando neste sentido: guardar o lado esquerdo. Inclusive, na dança do Orixá, a
mão é projetada um pouco para trás, próxima ou na direção da abertura posterior
do chakra frontal, que é o chakra regido pelo Trono do Conhecimento. O chakra
frontal se abre para frente e para trás. Na abertura da frente, Oxóssi está
irradiando o Conhecimento equilibrado. Na abertura posterior do frontal, Obá
atua para corrigir excessos e para dar amparo a quem precisa de foco e
concentração. Com certeza, aquele gesto tem muitos significados. Pois as lendas
têm vasto conteúdo, revelam parte da extraordinária riqueza cultural dos Povos
da Mãe África, de quem muito recebemos.
FONTE: http://seteporteiras.org.br/
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