1-
Oxalá cria a Terra:
No
começo, o mundo era todo pantanoso e cheio d’água, um lugar inóspito e sem
nenhuma serventia.
Acima
dele havia o Céu, onde viviam Olorum e todos os Orixás, que às vezes desciam
para brincar nos pântanos insalubres. Desciam por teias de aranha penduradas no
vazio.
Ainda
não havia terra firme, nem o homem existia.
Um
dia Olorum chamou à sua presença Orixanlá (Oxalá), o Grande Orixá. Disse-lhe
que queria criar terra firme lá embaixo e pediu-lhe que realizasse tal tarefa.
Para a missão, deu-lhe uma concha marinha com terra, uma pomba e uma galinha
com pés de cinco dedos.
Oxalá
desceu ao pântano e depositou a terra da concha. Sobre a terra pôs a pomba e a
galinha, e ambas começaram a ciscar. Foram assim espalhando a terra que viera
na concha, até que a terra firme se formou por toda parte.
Oxalá
voltou a Olorum e relatou-lhe o sucedido.
Olorum
enviou um camaleão para inspecionar a obra de Oxalá e ele não pôde andar sobre
o solo que ainda não era firme. O camaleão voltou dizendo que a Terra era
ampla, mas ainda não suficientemente seca. Numa segunda viagem o camaleão
trouxe a notícia de que a Terra era ampla e suficientemente sólida, podendo-se
agora viver em sua superfície. O lugar mais tarde foi chamado Ifé, que quer
dizer ampla morada.
Depois
Olorum mandou Oxalá de volta à Terra, para plantar árvores e dar alimentos e
riquezas ao homem.
E
veio a chuva para regar as árvores.
Foi
assim que tudo começou.
Foi
ali, em Ifé, durante uma semana de quatro dias, que Oxalá criou o mundo e tudo
o que existe nele.
2-
Obatalá cria o homem:
Num
tempo em que o mundo era apenas a imaginação de Olodumare, só existia o
infinito firmamento e abaixo dele a imensidão do mar.
Olorum,
o Senhor do Céu, e Olocum, a Dona dos Oceanos, tinham a mesma idade e
compartilhavam os segredos do que já existia e ainda existiria.
Olorum
e Olocum tiveram dois filhos: Orixalá, o primogênito, também chamado Obatalá, e
Odudua, o mais novo.
Olorum-Olodumare
encarregou Obatalá, o Senhor do Pano Branco, de criar o mundo, dando-lhe
poderes para isso.
Obatalá
foi consultar Orunmilá, que lhe recomendou fazer oferendas para ter sucesso na
missão. Mas Obatalá não levou a sério as prescrições de Orunmilá, pois
acreditava somente em seus próprios poderes.
Odudua
observava tudo atentamente e naquele dia também consultou Orunmilá, o qual
assegurou que se ele fizesse as oferendas prescritas, seria o chefe do mundo
que estava para ser criado. A oferenda consistia em quatrocentas mil correntes,
uma galinha com pés de cinco dedos, um pombo, um camaleão e quatrocentos mil
búzios. Odudua fez as oferendas.
Chegado
o dia da criação do mundo, Obatalá se pôs a caminho até a fronteira do além,
onde Exu é o guardião. Obatalá não fez as oferendas nesse lugar, como estava
prescrito. Magoado com a insolência, Exu usou seus poderes contra Oxalá,
provocando-lhe muita sede. Para aplacar a sede, Oxalá tocou com seu bastão no
tronco de uma palmeira e dela jorrou vinho em abundância. Ele bebeu vinho até
embriagar-se e adormecer na estrada, à sombra da palmeira de dendê, abandonando
o saco da criação que recebera de Olorum.
Odudua,
que tudo acompanhava, apanhou o saco da criação, foi até Olorum e lhe contou o
ocorrido. Então, Olorum-Olodumare confiou-lhe a criação do mundo.
Com
as quatrocentas mil correntes Odudua fez uma só e por ela desceu até a
superfície do mar. Sobre as águas sem fim, abriu o saco da criação e deixou
cair um montículo de terra. Soltou a galinha de cinco dedos e ela voou sobre a
terra, pondo-se a ciscá-la, espalhando a terra na superfície da água. Odudua
exclamou: “Ilè nfé!”, que significa: “A Terra se expande!”, frase que depois
deu nome à cidade de Ifé, a qual está exatamente no lugar onde Odudua fez o
mundo.
Em
seguida, Odudua apanhou o camaleão e o fez caminhar naquela superfície,
demonstrando a firmeza do lugar.
Obatalá
continuava adormecido. E Odudua partiu para a Terra para ser seu dono.
Então
Obatalá despertou, tomou conhecimento do ocorrido e foi contar tudo a
Olodumare, que lhe disse: “O mundo já está criado. Perdeste uma grande
oportunidade”.
Como
castigo, Olodumare proibiu Obatalá e seus descendentes de beberem vinho de
palma para sempre.
Mas
a missão não estava ainda completa e Olodumare deu outra dádiva a Obatalá: a
criação de todos os seres vivos que habitariam a Terra.
E
assim Obatalá criou todos os seres vivos e criou o homem e a mulher.
Obatalá
modelou em barro todos os seres humanos; e o sopro de Olodumare os animou.
O
mundo agora se completara. E todos louvaram Obatalá.
3-
Obatalá cria Icu, a Morte:
Quando
o mundo foi criado, coube a Obatalá a criação do homem.
O
homem foi criado e povoou a Terra.
Cada
natureza da Terra, cada mistério e segredo, tudo foi governado pelos Orixás.
Com
atenção e oferendas aos Orixás, tudo o homem conquistava.
Mas
os seres humanos começaram a se imaginar com os poderes que eram próprios dos
Orixás. Deixaram de fazer oferendas. Imortais que eram, pensavam em si mesmos
como deuses. Não precisavam de outros deuses.
Cansado
dos desmandos humanos, Obatalá decidiu viver com os Orixás no espaço sagrado
que fica entre o Aiê (a Terra) e o Orum (o Céu).
E
Obatalá decidiu que os homens deveriam morrer; cada um num certo tempo, numa
certa hora.
Então
Obatalá criou Icu, a Morte, encarregando-a de fazer morrer todos os humanos,
porém impondo-lhe uma condição: só Olodumare podia decidir a hora de morrer de
cada homem. A Morte leva, mas a Morte não decide a hora de morrer. O Mistério
Maior pertence exclusivamente a Olorum.
4-Oxalá
molda o ser humano com o barro:
Dizem
que quando Olorum encarregou Oxalá de fazer o mundo e modelar o ser humano, o
Orixá tentou vários caminhos: tentou fazer o homem de ar, como Ele. Não deu
certo, pois o homem logo se desvaneceu; tentou fazer de madeira, mas a criatura
ficou dura; de pedra a tentativa ainda foi pior; fez de fogo e o homem se
consumiu. Tentou azeite, água e até vinho de palma, e nada.
Foi
então que Nanã Burucu veio em seu socorro: apontou para o fundo do lago com o
seu ibiri, seu cetro e arma, e de lá retirando uma porção de lama. Nanã deu a
Oxalá a porção de lama, o barro do fundo da lagoa onde Ela morava.
Oxalá
criou então homem e o modelou no barro.
Com
o sopro de Olorum, o homem caminhou e com a ajuda dos Orixás povoou a Terra.
FONTE
DAS LENDAS: “Mitologia dos Orixás”, Reginaldo Prandi, 2005, Editora Companhia
das Letras, páginas 502/507.
5-Oxalá
desvenda os mistérios da vida e da morte:
Esta
lenda é contada no Candomblé:
Oxalá
era marido de Nanã, a Senhora do Portal da Vida e da Morte, da fronteira da
nossa dimensão para outras.
Por
determinação de Nanã, somente os seres femininos tinham o acesso àquele Portal.
Esta determinação servia para todos, inclusive para o próprio Oxalá. Durante
muito tempo assim foi.
Porém,
Oxalá não se conformava em não poder conhecer o Portal, não só porque era
marido de Nanã, como por sua própria importância no panteão dos Orixás.
Pensou
e pensou, até que encontrou a melhor forma de burlar as determinações da
esposa. Não fugindo de sua cor branca, vestiu-se de mulher, colocou o Adê
(coroa) com os “chorões” no rosto (próprio das Iabás), e se aproximou do
Portal, satisfazendo, enfim, sua curiosidade.
Mas
foi surpreendido por Nanã, que se aproximou e determinou: “―Já que te vestiste
de mulher para desvendar um segredo importante, vou compartilhá-lo contigo.
Terás a incumbência de ser o principio do fim, aquele que tocará o cajado três
vezes no solo para determinar o fim de um ser. Porém, jamais conseguirás te
desfazer das vestes femininas e daqui para frente terá todas as oferendas
fêmeas!”
E
Oxalá, conhecido por Oxalufan, passou a receber oferendas não mais como os
demais Orixás masculinos, e sim de cabras e galinhas, como as Iabás. E jamais
se desfez das vestes de mulher. Em compensação, transformou-se no Senhor do
princípio da morte e conheceu todo o seu segredo.
Oxalá,
portanto, é o fim. Não o fim trágico, mas pacífico, de tudo o que existe no
mundo. E por isso merece todo o carinho que lhe damos. Por isso, é o nosso
salvador, nosso conselheiro, aquele que vem nos momentos de angústia para
trazer algo de que o mundo precisa demasiadamente: a Paz.
FONTE E CRÉDITOS: http://seteporteiras.org.br/
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